Uma amiga me contou sobre o dia em que seu pai a ensinou a andar de bicicleta. Ela pedalando insegura, ele correndo atrás, segurando o selim. Então, aquele momento universal em que o pai finge ainda estar segurando enquanto a criança já se equilibra sozinha, sem saber. Minha amiga continuou pedalando. O pai, então, parou de correr, rindo, comemorando, começou a chorar. Estava ficando pra trás. Minha amiga disse, “meu pai percebeu que era uma espécie de despedida”.
Pais são essas criaturas estranhas que se emocionam com cada pequena independência conquistada, mesmo sabendo que toda independência é uma forma de partir. Quanto mais bem-sucedido o pai, mais rapidamente se tornará obsoleto. Pais são esses seres engraçados que celebram sua própria extinção.
A sabedoria do pai é perceber que criar um filho é um exercício constante de se tornar desnecessário.
O selim que se solta das mãos, a mochila que não precisa mais ser carregada, o cadarço que a criança aprende a amarrar sozinha — cada novo domínio é uma pequena morte do pai. O último livro que lerão juntos na cama, a última vez que dormirá no seu colo, o berço sendo desmontado, o adolescente que agora mora no quarto com a porta fechada.
Minha amiga pedala há mais de trinta anos. Já atravessou cidades em cima em duas rodas. Seu pai, um senhor de óculos, ainda sorri quando a vê montar na bicicleta. Ela me disse que, às vezes, ao pedalar, sente as mãos invisíveis do pai ainda segurando o selim. Nenhuma despedida é pra sempre.
A vida é incrível.
Desejo a você muito mais do que sorte.
Marcos Piangers
Emocionante! Parabéns!! Sua sensibilidade sempre me toca.
Doída, mas real.